terça-feira, 20 de maio de 2008

Miséria

No início da noite de domingo, na estação de Shimbashi, o homen da foto acima andava de um lado para outro, procurando moedas perdidas pelo chão da estação. Foi difícil conseguir fotografá-lo. (Além da constante movimentação, o capuz cobria os seus olhos...)

Na mesma noite, na estação de Akihabara, fomos abordados por um japonês de meia idade, que pediu 500¥ * ao Alex. Não estava mal vestido, nem parecia estranho. Sem entender o que acontecia, o Alex deu uma moeda para o homem que ficou muito grato e perguntou-nos sobre nosso país de origem...

Seguimos andando, chocados e mudos. Vic quebrou o silêncio:

- Coitado daquele homem, né?

-Por quê filho? - Perguntei.

-Porque ele não tem nenhum dinheiro...

Em Ueno também tem vários moradores de rua espalhados pelo bairro e algumas barracas, onde dormem. Nem todos são pedintes. Alguns vivem de arubaito**, isto é, serviços temporários, sem vínculo empregatício.

Quem vive só de baito*** deve ter mais dificuldade para pagar um seguro de saúde e demais custos importantes. Além de não ter garantia de emprego, não conta com direitos trabalhistas.

Há controvérsias quanto aos motivos que levam estas pessoas a viverem pelas praças de Tokyo. Alguns dizem que os que vivem em tais circunstâncias são rebeldes sem causa, ou que não gostam de trabalhar mesmo...Complicado pra gente de fora, sem domínio do idioma, compreender bem o que se passa.

Se esses personagens sociais são rebeldes, sem causa ou com causa, não sei mesmo dizer, nem posso julgar. Mas não podemos ignorar que na selva do capitalismo todos somos afetados em algum grau e há os que esmorecem por não suportar tanta pressão.

Vários fatores podem levar um ser humano à vida na rua e o único fato que posso afirmar, seguramente, é que isso ocorre do lado de cá também.

Pobreza, miséria e abandono fazem parte do Japão. Acontece que figuras obscuras não costumam ser pintadas onde limpeza e perfeição são as máximas permitidas. Mas verdade seja dita: aqui também não é o país das maravilhas, embora tenha os seus encantos.


*Com 500¥, é possível fazer um lanche ou uma refeição barata, também é possível comprar uma passagem de metrô para andar algumas estações.

** Arubaito vem do alemão"arbeit" e signica, originalmente, trabalho. Aqui, porém, tanto a palavra quanto o seu significado sofreram alterações.

***baito -modo informal e abreviado de dizer arubaito

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"A gente não quer só dinheiro,

A gente quer inteiro e não pela metade"



5 comentários:

Marilia Melo disse...

Ja aconteceu com o Claus de pedirem dinheiro pra ele tambem. Do mesmo modo, ele ficou tao assustado que deu o dinheiro.

Isso talvez aconteca mto mais frequente com estrangeiros, pois algo que o japao nao tem "muito" (pra nao dizer nada) eh religiao. E por mais que o Brasil atual nao seja o exemplo de pais religioso, acoes como a "caridade" ainda fazem parte do nosso costume.

Uma aluna japonesa me disse que um japones jamais daria dinheiro pro outro.

Fran disse...

Pois é menina, Marilis...Algo que percebi, ali, naquele momento, é que vários japoneses ficaram olhando o que acontecia com cara de perplexidade ou vergonha pelo cara...Isto me deu mais pena ainda do homem. Fiquei imaginanando o quanto deve ter sido humilhante para ele pedir e tbm imaginei, como vc mencionou, que ele estivesse a espreita de estrangeiros que psassassem...Realmente, pelo que percebi, japonês algum ali daria algo a ele. (Talvez um croque na cabeça e um : Obekaaaa!!!)
Mas a questão não acho que se reduza aos valores religiosos, embora,concorde que isto deva motivar muitos brasileiros aos atos caridosos...Acho que os japoneses, em geral, são bem individualistas mesmo.
"Ema, ema, ema, cada um com seus problemas", parece que é o lema deles..."Não faz parte do grupo? Azar o teu!" Estranho, mas sinto e vejo muito isto por aqui...E revi isto naquela cena...Achei muito triste, muito mesmo!

Jeff disse...

Fran, eu acredito que a questão do desemprego é um problema estrutural do capitalismo. Ele necessita de um "exército de reserva" (famoso termo de marx) pra poder baixar o custo da mão de obra. O fato de haver mais trabalhador que emprego é fundamental pra dar poder aos patrões... sem contar a questão da tecnologia que, ao invés de poupar trabalho humano e empregar mais gente é usada pra fazer um número cada vez menor de trabalhadores trabalharem mais... beijocas, jeff

Fran disse...

Abaixo,fragmentos de um texto acadêmico sobre SUICÍDIO e JAPÃO,escrito por Kayoko Ueno e traduzido por Eva Paulino Bueno:

"... O fato que o número de suicidas está aumentando entre homens de meia idade com problemas financeiros ressalta a responsabilidade masculina de manter a sua família, e algumas vezes os seus empregados. Esta é uma realidade ainda mais pungente em dias de dificuldades econômicas. Alguns suicídios são como uma tentativa, por parte dos suicidas, de conseguir dinheiro do seguro de vida para sua família. Um fenômeno que tem sido observado é que um dos padrões mais comuns em suicídios é que eles ocorrem quando o período de carência do seguro termina."

"...é aparente que o aumento do suicídio é inseparável da recessão econômica e dos déficits do sistema da previdência social no país. As Estatísticas Vitais do Japão revelam que na última década o número de suicídios está diretamente relacionado ao desemprego: quanto maior o índice de desempregos num ano, mais suicídios ocorrem, e vice-versa. ..."
Ctl+C Ctl+V de:
http://www.espacoacademico.com.br/044/44eueno.htm
VALE A PENA CONFERIR!!!

Deborah Vogelsanger Guimarães disse...

Li o artigo todo, muito interessante! São muitos pontos a discutir, por hora indico um livro que em bom português se chama 'O pensamento japonês' de Hitoshi Oshima. Infelizmente não há versão eletrônica que eu tenha encontrado e o título em japonês não consta de edição que tenho.
Ajuda muito a entender o comportamento que vocêss descrevem nas postagens.