sábado, 13 de dezembro de 2008
Não me conformo!
Gente, fiquei chocada. Mais uma vez: CHOCADA!
Chegou ao Brasil a moda dos EUA (claro!) de alugar bolsas e outros acessórios de grifes famosas e caras (ou seriam, caras e famosas?).
Quero acreditar que entendi errado, mas ouvi dizer o valor do aluguel de uma bolsa por R$400,00!!! Detalhe: pra "bonita" usar NUMA festa chic!!!
Ah, mas a dona da loja explicou: que um "mimo desses custa R$6.000,00, na verdade". E a besta do entrevistador afirmou que:" em tempos de crise, as pessoas devem mesmo usar a criatividade".
Mimo?! Que nojo! Isso é IMORAL!!!
Crise? Nesse caso, crise de Valores, não?
Criatividade? Na selva de pedras até os conceitos perdem seus Valores.
sábado, 29 de novembro de 2008
(Meu) Silêncio
domingo, 2 de novembro de 2008
A gente se vê!
terça-feira, 30 de setembro de 2008
Não sumi!
Depois eu conto tudo, ou quase tudo, ou nada.
Hoje ganhei algo bonito do Alex e agora divido o presente com quem quiser:
sábado, 28 de junho de 2008
Chove chuva...
(Enquanto isso, nesse domindo chuvoso, vamos resolver algumas coisas e tirar fotos que uma amiga pediu para um trabalho de faculdade dela aí no Brasil...)
SOIDÃO- Oswald de Andrade
Chove chuva choverando
que a cidade de meu bem
está-se toda se lavando
Senhor
que eu não fique nunca
como esse velho inglês
aí ao lado
que dorme numa cadeira
à espera de visitas que não vêm
Chove chuva choverando
que o jardim de meu bem
está-se todo se enfeitando
A chuva cai
cai de bruços
A magnólia abre o pára-chuva
pára-sol da cidade
de Mário de Andrade
A chuva cai
escorre das goteiras do domingo
Chove chuva choverando
que a cidade de meu bem
está-se toda se molhando
Anoitece sobre os jardins
Jardim da Luz
Jardim da Praça da República
Jardim das platibandas
Noite
Noite de hotel
Chove chuva choverando
segunda-feira, 23 de junho de 2008
Eles me dominam
Ele sempre ouve falar em "papai do céu". Eu mesma, para ser coerente com a prática do Alex, faço com o Vic um agradecimento noturno ao "papai do céu", pela vida e pelo dia que termina. É mais uma forma de incentivar a gratidão ao mesmo tempo em que mantemos uma rotina de preparo para ele dormir.
Outra noite ele me fez a famigerada pergunta:
Um dia o Vic revelou para mim a sua própria teoria sobre quem é o "papai do céu": UM GRANDE MÁGICO...
No início de 2007, minha cabeleira já estava precisando de um corte. Fui, então, para um salão de cabeleireiro japonês. Resoluta e muda apontei para uma foto que vi numa revista.
O Vic ficou em estado de choque quando me viu, e disse:
-Eu gosto mamãe! Calma que a gente vai dar um jeito...Hm...Hm...
-E será que o seu papai ainda vai gostar de mim? (Buááá)
-Hm...Acho que vai sim! Ele é legal...
-E se ele não gostar mais?! (Buááá)
-Calma mamãe, ele vai gostar, sim...Tá tudo bem! Eu vou pensar num jeito...
-Ai, ai...Que tristeza... Eu não queria ficar feia... (buááá)
(Tóim!)
Não contive uma boa gargalhada. Depois enchi o guri de beijinhos e apertões. Por último expliquei a ele que cabelos crescem :) (E, claro, eu mesma tinha que me conformar com isso...)
-É, né, mamãe? Já cresceu...Não tava tããão feio assim...Você pode até cortar de novo se quiser...
quinta-feira, 19 de junho de 2008
Nosso próximo presidente?
Vi hoje este vídeo. Diz respeito a um possível candidato à presidência da República nas próximas eleições...Que meda! :(
O filme é curto e importante. Cheguei a ele através do blog "tamos com raiva"
sexta-feira, 13 de junho de 2008
Eu não sou daqui.
Onde eu a ouvi? Então...Num filme que...bem, é um filme com final previsível, beeem otimista, norte americano e tals, mas...Sei-lá. Eu gostei. Fiquei emocionada. Chorei...Blá, blá e tals...O nome do filme é: Ensinando a viver. Conta uma história de adoção.Uma história diferente, meio fabulosa, mas emocionante. Bem...eu sou uma chorona mesmo. Além do mais, histórias (de amor) de família me emocionam...
Olha, quer saber, na pior das hipóteses, ouça a música, ela é legal. Quer dizer...Eu gostei. Gostei sim!
Enfim, com vocês, Satellite! :)
quinta-feira, 12 de junho de 2008
"Quem tem alma não tem calma"
Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem acabei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,
Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.
Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que segue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo : "Fui eu ?"
(...)
Alberto Caeiro (ou Fernando Pessoa)
segunda-feira, 9 de junho de 2008
Homicídio
Nervoso, irritado, bravo, muito, muito bravo. Quem não fica?
As fotos são do jornal japonês Mainichi
sábado, 7 de junho de 2008
Estranha no ninho!
A japonesada por onde ela passava, dizia (inevitavelmente) sorrindo quando via a nipo-miniatura:
quarta-feira, 4 de junho de 2008
Aos meus amigos
Solidão e saudade deixa a gente triste e abatido mesmo, parece que não tem jeito. Mas a ausência física, ainda mais nos dias atuais, não nos impede de comunicação e amizade, não é mesmo?
Meu coração se enche de alegria e gratidão pelos amigos queridos que, quando podem, "aparecem" para dizer um olá, seja por e-mail, orkut, aqui mesmo no blog, pelo correio tradicional, ou através de um telefonema. Esses sinais de vida fazem diferença.
Cada vez que um amigo nos envia uma notícia boa ou alguma outra mensagem (própria), é um pedacinho bom do Brasil que recebemos! :)
Esperança e amizade é o que nos mantém firmes em nosso exílio. Estou aprendendo (ainda!) que mesmo quando as escolhas que fazemos ou o imprevisível separa nossos caminhos daqueles que gostamos tanto, a amizade pode mesmo permanecer.
Em qualquer lugar podemos sentir o carinho e a presença dos amigos. Estão sempre em nossos corações e pensamentos porque nutrem (também) esse bom vínculo afetivo.
Alegra-me cada amigo que tenho. Não vou citar nomes, quem é amigo sabe...
A todos vocês que não saem do meu coração e que me ajudam a acreditar que longe é lugar que pode não existir, minha gratidão.
quinta-feira, 22 de maio de 2008
Suicídio
O artigo escrito pela socióloga Kaioko Ueno e traduzido por Eva Paulino Bueno, foi publicado pela revista Espaço Acadêmico.
A socióloga pontua o desemprego e o déficit de assistência pública como importantes dados a serem considerados na análise das causas atuais de suicídio no Japão.
Confira, abaixo, dois fragmentos do artigo: "O suicídio é o maior produto de exportação do Japão?
Notas sobre a cultura de suicídio no Japão"
"...Então vários estudos estimam o número futuro de suicídios dependendo da taxa de desemprego, mas estes estudos raramente observam a relação entre o déficit do sistema de assistência pública e o suicídio. Entre as nações economicamente avançadas, a porcentagem dos que recebem assistência pública no Japão tem sido baixíssima (1,5% em 2003), devido a uma avara política de assistência pública."
"O lançamento de um sistema de aconselhamento com uma linha direta pode talvez funcionar para algumas pessoas, mas não vai funcionar para aquelas com sérios problemas financeiros. A saúde mental não tem que ver com medida política, mas como a taxa de desemprego vai ser analisada e como uma espécie de rede de segurança vai ser colocada à disposição dos que dela necessitam. É impossível impedir-se suicídios que são induzidos por razões econômicas com a diminuição do orçamento da previdência social. Os empregos com salários decentes para homens e mulheres, assim como um generoso programa de assistência pública podem parecer uma rota indireta, mas este é, na realidade, o caminho mais secular de impedir-se o suicídio."
Para ler o texto todo, clique aqui!
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PS: Já pensou se no Brasil reinasse o "espírito samurai" entre os desempregados e desassistidos sociais? :/
terça-feira, 20 de maio de 2008
Lembrete
Miséria
Na mesma noite, na estação de Akihabara, fomos abordados por um japonês de meia idade, que pediu 500¥ * ao Alex. Não estava mal vestido, nem parecia estranho. Sem entender o que acontecia, o Alex deu uma moeda para o homem que ficou muito grato e perguntou-nos sobre nosso país de origem...
Seguimos andando, chocados e mudos. Vic quebrou o silêncio:
- Coitado daquele homem, né?
-Por quê filho? - Perguntei.
-Porque ele não tem nenhum dinheiro...
Em Ueno também tem vários moradores de rua espalhados pelo bairro e algumas barracas, onde dormem. Nem todos são pedintes. Alguns vivem de arubaito**, isto é, serviços temporários, sem vínculo empregatício.
Quem vive só de baito*** deve ter mais dificuldade para pagar um seguro de saúde e demais custos importantes. Além de não ter garantia de emprego, não conta com direitos trabalhistas.
Há controvérsias quanto aos motivos que levam estas pessoas a viverem pelas praças de Tokyo. Alguns dizem que os que vivem em tais circunstâncias são rebeldes sem causa, ou que não gostam de trabalhar mesmo...Complicado pra gente de fora, sem domínio do idioma, compreender bem o que se passa.
Se esses personagens sociais são rebeldes, sem causa ou com causa, não sei mesmo dizer, nem posso julgar. Mas não podemos ignorar que na selva do capitalismo todos somos afetados em algum grau e há os que esmorecem por não suportar tanta pressão.
Vários fatores podem levar um ser humano à vida na rua e o único fato que posso afirmar, seguramente, é que isso ocorre do lado de cá também.
Pobreza, miséria e abandono fazem parte do Japão. Acontece que figuras obscuras não costumam ser pintadas onde limpeza e perfeição são as máximas permitidas. Mas verdade seja dita: aqui também não é o país das maravilhas, embora tenha os seus encantos.
*Com 500¥, é possível fazer um lanche ou uma refeição barata, também é possível comprar uma passagem de metrô para andar algumas estações.
** Arubaito vem do alemão"arbeit" e signica, originalmente, trabalho. Aqui, porém, tanto a palavra quanto o seu significado sofreram alterações.
***baito -modo informal e abreviado de dizer arubaito
**********************************
"A gente não quer só dinheiro,
A gente quer inteiro e não pela metade"
terça-feira, 13 de maio de 2008
Buraco no chão.
Obenjoo, já foi a palavra usada para designar o que em português conhecemos por banheiro. Com o passar dos anos e a influência das culturas externas, a antiga palavra caiu em desuso.
No Japão moderno, as pessoas dizem "toire". (A palavra francesa "toillet", deu uma passadinha pelos EUA, onde esqueceu um "l". Depois veio para a terra do sol nascente onde, aculturou-se substituindo o outro "l" por um nipo "r" e dispensou o "t". Por aqui tudo muito sintético.)
O fato de "obenjoo" ter se tornado uma palavra antiquada, porém, não garante que os banheiros por aqui sejam todos chique-chiques. Embora estejamos num "high-tech country", onde, sim, encontramos vasos sanitários com botões de comando, tampas automáticas etc, o velho buraco no chão persiste em vários shoppings centers e outros lugares públicos...
Abaixo, um desenho infantil japonês. Neste episódio, Shimnjiro, o personagem principal, ensina à criançada (e aos estrangeiros também rsrsrs) a forma correta de usar o vaso sanitário tradicional. Para aprender precisa ver até o fim ;)
Ruas estreitas
Abaixo, uma rua de mão dupla. Pasmem, pasmem e pasmem. Mas se vierem dirigir por aqui, precisam se acostumar. Pasmou, bateu!
Com tanta estreiteza assim, os "mini cars", também conhecidos como kei , fazem muito sucesso por aqui.
segunda-feira, 12 de maio de 2008
Idoso trabalhador
Nesta região, vemos diariamente idosos como este da foto. Com visíveis problemas na coluna vertebral e pobres. Geralmente são pessoas assim que habitam aquelas casinhas que viram no post anterior.
Atrás do vovô, têm algumas máquinas de brinquedos infantis, onde as crianças colocam uma moeda de 100 ienes, ou duas, para pegar alguma "surpresa".
O calçado que o vovô está usando é conhecido como tabi , e é usado especialmente por certos trabalhadores. O tabi é encontrado facilmente aqui no Japão em lojas "Work Man" ou departamentos de materiais para construções e reformas.
segunda-feira, 5 de maio de 2008
Aqui também tem...
segunda-feira, 28 de abril de 2008
A Tulipa, o tatu e a tempestade
- Minha sensei* falou que cuida das flores pra gente!
Numa manhã de segunda feira, finalmente vimos sua tulipa púrpura. Victor ficou encantado. Perguntou:
-Mamãe, o que aconteceu? Foi mágica?
(Tudo o que ele gosta e não sabe explicar, pergunta para os adultos se trata-se de mágica.)
-Não filho, não foi mágica. Foi o seu cuidado. A semente virou flor porque você cuidou dela!
-Ela não é linda mamãe? Minha chuurippu**...
-É sim Vic, todas as flores são lindas!
-Minha chuurippu morreu, mamãe!
-Filho, as flores são lindas, mas morrem um dia. E outras nascem...
Ele ficou calado.
À noite, Alex desavisado, contou para o Victor uma história sobre um menino que amava muito a sua florzinha e cuidava bem dela.
Quando a história chegou ao fim, Vic estava chorando baixinho. Lembrou-se de sua "chuurippu" e contou para o papai que sua florzinha tinha morrido.
Explicamos a ele, mais uma vez, que as plantas nascem, crescem e morrem. Mas que outras novas nascem...Abraçamos o nosso filhote.
Falei que tudo ficaria bem:
-Papai e mamãe estão aqui com você. E outro dia você pode plantar outra semente...
Ele respondeu chorando:
-Mas aquela era a minha chuurippu...
Ficamos todos agarradinhos até o Vic domir.
Outro dia, novo dia. O luto já havia sido feito.
Uma semana depois, nosso menino, de olhos grandes e brilhantes, voltou alegre da escola. Estava com uma caixa de leite cortada ao meio e entreaberta.
-É o meu bichinho! Olha...
-Que?!
-Este é o meu dango-mushi***!
Um tatuzinho encontrado no jardim da escola, era a bola da vez.
-Você falou que no apartamento não pode ter cachorro, nem gato... Esse é bem pequenininho e não faz sujeira. Daijoubu****, né, mamãe?
-Filho, talvez o Sr. Tatu Bolinha prefira ficar passeando no jardim da escola. Tatus gostam de terra e de plantas.
-Não, esse aqui é diferente dos outros. Ele é meu bichinho, vou cuidar bem dele!
-Hmm... Você pode experimentar, mas ele vive poucos dias, tá?
-Mamãe eu vou cuidar bem dele!
-Tudo bem, só quero que você saiba que ele vive poucos dias.
Mais tarde...
-Mamãe, eu perdi a Tatu Bola! Mamãe, me ajuda achar ela!
-Filho, talvez ele tenha saído para procurar uma plantinha...
-Mamãe, se ela tentar atravessar a rua, ela vai morrer!
-Filho, está tudo bem. Deixe o tatuzinho passear. Acho que ele já encontrou alguma planta, aqui mesmo, dentro do shopping...
Mas o menino Victor ficou frustrado. Continuou olhando para o chão enquanto saíamos do shopping. Ficou calado até chegarmos em casa. Depois voltou, aos poucos, a conversar.
E a vida continua...
Por esses dias:
-Mamãe, quando a gente voltar para o Brasil eu posso ter um cachorrinho?
-Pode sim, filho.
-E ainda falta muito pra gente voltar pro Brasil?
... Navegar é preciso. Sonhar também.
* sensei = professora
**chuurippu = tulipa
***dango mushi = tatu bolinha
**** Daijoubu = Tudo bem
quinta-feira, 24 de abril de 2008
Rir e recomeçar
Fatima está por aqui trabalhando um pouco em sua área, um pouco em outras. Ela destacou um detalhe interessante da vida aqui. Estamos num país que nos permite viver e manter família lavando pratos, se for preciso. De onde viemos, não importa o quanto tenhamos estudado, o retorno tem sido humilhante há tempos.
Nossa conversa me fez lembrar de situações para as quais não pretendo voltar.
E como o bom humor ajuda a gende a não desmoronar, vamos rir e tentar um recomeço...Afinal, "sou brasileira e não desisto nunca" (hehe)
quarta-feira, 23 de abril de 2008
O preço
Meu celular é praticamente mudo já que não conheço muita gente por aqui e destas, poucas têm o número dele. Na verdade meu telefone é útil por causa da escola do Victor. Podem me contactar em caso de emergência. Também é útil por causa do Alex que trabalha em outra cidade e pode querer falar comigo durante o dia.
Meus dias aqui são como meu celular, bastante silenciosos. Quase nada acontece. A vida na roça é bem pacata e os acontecimentos são bem previsíveis, com eventuais turbulências ocasionadas por questões de saúde, cocôs de gatos ou aquelas outras questões de vizinhança que já comentei em posts antigos.
Ontem foi um dia de rara aventura. Tive imprevistos. Lidei com gente.
Alex sempre me conta como é a relação dele com seus colegas de fábrica e me alerta: "Chegando ao Brasil, você vai precisar de alguns meses de reinserção social." Ele acredita que vou levar um choque ao redescobrir a vida em um grupo maior de pessoas.
O palpite do Alex é coerente.Estou mais alien a cada dia...
Excepcinalmente ontem, três pessoas tentaram telefonar para mim num período em que eu estava usando o celular com uma quarta pessoa.
Este foi o começo da diferença em meu singelo cotidiano. Mas o tumulto mesmo veio mais tarde, quando fui atrás de uma senhora que não atendia ao meu telefonema resposta...
Ela abriu a porta com olhos de raiva e me disse muitas coisas. Estava bem alterada. Acho que posso resumir as palavras que ouvi em três queixas:
1)"Por quê VOCÊ "nunca" atende aos meus telefonemas?"
2)"Por quê VOCÊ ME desmerece?"
3)"Por quê VOCÊ faz ISSO SÓ COMIGO?"
Fiquei sinceramente comovida. Expliquei para ela que, por incrível que pareça (!), eu estava com alguém ao telefone, mas que logo que foi possível eu retornei a sua ligação... Pedi desculpas pelo mal entendido. Expliquei que não era algo pessoal etc.
A "Dona" quis ver meu celular, para confirmar que eu estava mesmo atendendo uma chamada no período em que ela telefonava para mim...Embasbacada, fui entregando o aparelho para ela ao mesmo tempo em que me perguntava se isto estava mesmo acontecendo e se isto poderia estar certo em algum lugar do mundo...Pensamentos, lembranças e projeções me ocorreram em segundos...(Eu estava numa situação bem delicada.Esta senhora me socorreu numa manhã quando eu estava de vômito em vômito, numa crise aguda de dor, por causa do cálculo renal. Também se ofereceu para fazer a tradução da minha consulta no dentista. Aceitei o favor oferecido quando ela me informou -e isto não me surpreende mais por aqui- que o dentista não atende pacientes que não falam japonês, ou que estejam acompanhados por intérpretes...)
Enfim, acho que pela lei da sobrevivência, mais que pela política da boa vizinhança, eu cedi. Entreguei nas mãos da "dona" o meu celular. Ela conferiu se o que eu disse era verdade e informou à besta aqui, um novo horário de consulta.
Mais tarde, no caminho para o consultório, fui informada pela "dona" que ELA tinha providenciado a SUA filha pra cuidar do MEU filho, junto com SUA neta, durante o NOSSO compromisso...
Fiquei constrangida, agradeci e tentei explicar que o Vic ficaria bem na sala de espera, vendo revistas ou brincando. Minha opinião não fez diferença, claro.
Quando fomos deixar o Vic na casa da moça, já cheguei pedindo desculpas pelo incômodo e sua filha me falou baixinho: "Depois a gente conversa sobre a minha mãe" e deu uma piscada...
Outro dia, ouvi por aqui mesmo: "Ninguém é bonzinho. Nada é gratuito nessa vida. Nada!"
Além do japonês, tem outras coisas difíceis que estou aprendendo aqui no arrozal. Lidar com inusitados pode ser útil.
ps:Acho que eu poderia ter começado assim, hoje: "Meu querido diário..."
domingo, 13 de abril de 2008
Ventos do Oriente
Acho que a tv de um país revela bastante, e modela também, a cultura de seus nativos.
No Brasil, pelo menos, isso é facilmente notável e verdadeiro.
O assunto que vou tratar aqui é frequentemente visto na tv japonesa, em desenhos animados, programas de auditório e outros. Pela frequência e diferença, chamou minha atenção e quero compartilhar mais essa estranha experiência com meus amigos brasileiros.
O fato é que não sei como abordar sobre o flato. Sou brasileira e tenho meus pudores de ocidental. E pelas nossas bAndas, pum é assunto de foro privadO.
Enquanto no Brasil os programas de auditório, as novelas, enfim, o circo é montado em torno da sexualidade e da criminalidade, os japoneses deleitam-se com estrépidos puns. Outra coisa que diverte bastante os nipônicos são competições de erucção e de comilança. Confesso: acho o humor dos japoneses pra lá de esquisito...
No Brasil aprendemos desde criancinhas a controlar nossas ventosidades diante de outras pessoas. Se uma criança deixa escapar um pum entre os coleguinhas vira motivo de piada e sua vida escolar pode passar a ser um pesadelo por conta do incidente. Tive um colega que passou por isso, foi apelidado de Bufa. Depois de um episódio desastroso, nunca mais o loirinho foi chamado pelo nome...Nunca mais! Isso pode ser trágico para um adolescente... "Bufa" talvez tivesse sido promovido a herói da escola aqui no Nihon, representante de classe, o garoto do ano...Sei-lá...Talvez naquele fatídico dia, meu colega estivesse fazendo a coisa certa no país errado...
Aqui, não. Pum e arroto são aceitos entre colegas, não apenas, aliás! Já levei alguns traques em filas de supermercado, por exemplo. O pior é que as pessoas nem disfarçam, mudando de fila,ou algo assim. Agem com a mesma naturalidade como agimos quando bocejamos. (E eu imaginava as japonesas tão meiguinhas...Olha só, quanto preconceito!)
Quando fui compartilhar esta minha estranha experiência com outros brasileiros que vivem aqui, descobri, como o marido traído da história clássica, que isso por aqui é muito comum (refiro-me ao pum, não ao marido traído, que também pode ser muito comum,mas disso eu não sei). Todo mundo tinha alguma experiência com um f(L)ato cultural japonês pra contar...De onde concluí que as agências de viagens deveriam ser mais honestas com os estrangeiros, precavendo cada aventureiro sobre um dos outros choques culturais importantes. Mas não, eles insistem em ressaltar aquelas informações básicas que todo o mundo já sabe: "Come-se com hashi, o motorista senta-se ao lado direito, cumprimenta-se inclinando o corpo para frente e não apertando as mãos e blá blá blá..."
Quem não conhece aquele discursso sobre o quanto a cultura japonesa preza pelo sossego do próximo, não gosta de causar incômodo aos semelhantes, é muito disciplinadora, etc? Lamento que a forma como "enfrentam" os gases humanos por aqui fique fora desse discurso do "modelinho básico- padrão". Afinal, é uma questão cotidiana importante que implica na qualidade de vida de todos, não?
Estranho pra gente.Para eles, normal, no máximo engraçado...E se você for muito bom nisso, de repente, pode ficar famoso num programa de TV e ganhar uma grana! Convenhamos, mais fácil que entrar para um Big Brother, hein?
sábado, 5 de abril de 2008
Escolhas
Frase tão simples e tão apropriada! Tenho pensado nela, quase que diariamente, desde que o amigo Gu (Coelho) escreveu a "bem-dita" (e escrita) para mim.
Por estes dias a frase está mais vívida em meus pensamentos. Tenho tentado cultivar com o melhor de mim uma pequena bela flor. Uma escolha que fiz, entre outras tantas na vida.
Estou em paz com a minha decisão de não voltar a trabalhar numa escola, nesse momento. Estou feliz por participar ativamente do desenvolvimento e da aprendizagem do meu filho. Tenho aprendido bastante com ele também. Nunca alfabetizei uma pessoa antes e a experiência tem sido emocionante. Vê-lo e ajudá-lo a desenvolver o seu raciocínio linguístico tem sido uma experiência muito especial, como mãe. E, se por um lado tenho tido dificuldades técnicas (não sou pedagoga), por outro, tenho tido a felicidade de presenciar este momento único na vida do meu garotinho...Momento mágico :)
Fazemos nossos percussos através de nossas escolhas. Acho uma grande infelicidade quando assassinamos a nossa liberdade de escolha para percorrermos caminhos que outros definiram como bons ou ruins. Já fiz isto muitas vezes. Mudei. Espero continuar sentindo que estou fora da gaiola.
Ainda há muitas outras coisas que quero fazer em minha vida. Mas sinto que, neste momento, esta minha pequena flor requer mais dedicação.
E é assim que quero fazer cada trabalho. Quero fazer o que eu gosto, o que eu quero, o que eu escolher. Para que eu possa fazer com prazer e dedicação.
Sou o que faço de mim e tenho sempre a liberdade de me reinventar. Enquanto eu viver.
Ps: O Vic continua frequentando o yoochien. Japonês na escola, português em casa :)
Seus horários variam em cada época do ano, conforme a estação. Oscila entre às 9h da manhã e 15h. Nunca mais cedo ou mais tarde.
quarta-feira, 19 de março de 2008
Quase deuses
(Acho que nunca falei de filme aqui, né?)
Um filme bacana. Baseado em história real de dois pesquisadores nos EUA, na déc de 30. Um médico-cirurgião branco e um rapaz negro que sonhava em cursar medicina, mas que perdeu anos de investimento bancário para realizar o seu sonho...Restou ao rapaz ser faxineiro do médico branco-exótico ( ou obsessivo-claro, um pesquisador!), que percebeu o pontencial de seu empregado e começou a "investir" e apostar nele . A parceria foi dando certo e aí se desenrola a história que eu não vou contar aqui- nééé?!
Uma das coisas que achei brilhante no filme foi a abordagem suave, mas clara, dos vários relacionamentos que se entreleçam para acontecer a história. Alfred e Vivien/ Alfred e a liga médica/Vivien e sua esposa/ Vivien e a sociedade norte americana da época.
Ah, a academia! Sim, ela tem um lugar singular na história também...Claro, claro...O que me lembrou, aliás, daquele texto do Cristaldo que publiquei aqui no blog por estes dias atrás.
Falando nisso, gostei de Blalock, ao dizer :
-Eu continuo o mesmo hipócrita bastardo... (Acho que a expressão facial de Blalock não poderia ser melhor!)
E gostei muito do que Vivien respondeu:
-Não é por você, é pelo serviço. Gosto do que faço.
Não sei se o diálogo é exatamente assim. Mas foi como ficou em minha memória...
Também nunca saberemos se tais diálogos existiram, mas foi um momento catártico pra mim :)
Gostaria que meus amigos assistissem o filme. É bom compartilhar.
Bjo a todos e saudades sem fim.
sexta-feira, 14 de março de 2008
Aprendendo a ensinar
Eis que decidimos alfabetizar o Vic em português. (Afinal voltamos "logo" para o Brasil... )
Primeira "aula", hoje, comecei perguntando:
-Filho, quais palavras você conhece, que começam com a letra A?
-Hm...Kumo*, Hikooki**,Tanjookai***...
-Ok, filho, mas a mamãe ensina português e vc falou japonês...
-Mamãe, é só traduzir!
* aranha, **avião, ***aniversário
Crianças...
quarta-feira, 5 de março de 2008
Hinamatsuri
Embora não seja feriado, o Hinamatsuri (festival de bonecas, ou dia das meninas) é um dia importante para as famílias japonesas.
Aqui no japão tem dia das meninas e dia dos meninos. Sobre o dia dos meninos vou escrever quando chegar a época. Sobre o dia das meninas escrevo agora, com atraso.
No dia 3 de março, as meninas ganham bonecas, mas não são quaisquer bonecas, são miniaturas que simbolizam a corte japonesa!
Não existe dia das meninas sem um hinadan( plataforma em degraus que aparece no vídeo acima), onde ficam expostas as miniaturas que representam o imperador e a imperatriz, no alto e as demais figuras da corte, descendo, em ordem de importância. As bonecas são feitas de porcelana e usam roupas tradicionais. Cada pequena peça custa uma fortuna!
As meninas recebem as miniaturas como presente dos pais e demais familiares. Peça por peça, desde bebê, as pequeninas vão ganhando os objetos para completar o conjunto todo da corte.
Há também as meninas que recebem o jogo completo do hinadan como herança de família.
Além da plataforma especial, o ambiente é decorado com flores (artificiais ou não) que representam felicidade no casamento (tem que casar, hein, mocinha!), saúde, beleza e tudo que uma japonesinha PRECISA (pelo menos por enquanto) :)
A festa familiar acontece entre doces típicos, shiro sake : uma bebida doce preparada com arroz fermentado (nunca experimentei) e brinaceiras comportadas (de mocinhas), como por exemplo: otedama* (foto ao lado)
No passado acreditava-se ( talvez ainda hoje, em algumas famílias) que o Hinamatsuri afastava os mau sespíritos que cercavam as meninas.
Depois da cerimônia, o hinadan é desmontado e guardado para o ano seguinte. :)
PS: Quer saber mais detalhes? Então dá um clique aqui!
PS1:Acho curioso como a tradição se mantem ao lado do novo, aqui no Japão. Ao mesmo tempo em que há cerimônias típicas como esta, onde podemos perceber que as meninas são (pré) destinadas ao matrimônio e a maternidade, por outro lado vemos, pelas ruas, adolescentes radicalizando com mini-saias, maquiagens ousadas, cabelos coloridos e gargalhadas atípicas. Por um lado, permance a idealização familiar da japonesa comum: esposa e mãe. Por outro lado, vemos adolescentes quebrando paradigmas, com ousadia. Será que estamos presenciando os últimos dias do Hinamatsuri?
sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008
Ando devagar porque já tive pressa
E levo esse sorriso porque já chorei demais
Hoje me sinto mais forte, mais feliz quem sabe
Só levo a certeza de que muito pouco eu sei
Ou nada sei
Conhecer as manhas e as manhãs
O sabor das massas e das maçãs
É preciso amor pra poder pulsar
É preciso paz pra poder sorrir
É preciso a chuva para florir
Penso que cumprir a vida seja simplesmente
Compreender a marcha e ir tocando em frente
Como um velho boiadeiro levando a boiada
Eu vou tocando dias pela longa estrada eu vou
Estrada eu sou
Conhecer as manhas e as manhãs
O sabor das massas e das maçãs
É preciso amor pra poder pulsar
É preciso paz pra poder sorrir
É preciso a chuva para florir
Todo mundo ama um dia todo mundo chora
Um dia a gente chega, no outro vai embora
Cada um de nós compõe a sua história
Cada ser em si carrega o dom de ser capaz
E ser feliz
Conhecer as manhas e as manhãs
O sabor das massas e das maçãs
É preciso amor pra poder pulsar
É preciso paz pra poder sorrir
É preciso a chuva para florir
Conhecer as manhas e as manhãs
O sabor das massas e das maçãs
É preciso amor pra poder pulsar
É preciso paz pra poder sorrir
É preciso a chuva para florir
quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008
Hipnose sonora, aqui também tem!
(Força de expressão, claro! Imagino que em agências funerárias prefiram o silêncio, que é mais conveniente, em minha opinão...)
Estava quase decorando um trecho da música sem nem saber do que se tratava a baladinha pueril...(que tornou-se um inferninho, pra falar em português bem claro) "Baby boy /atashi wa koko ni iruyo /doko mo ikazu ni matteru yo..." :P
A gente já chega aos vendedores, ou prateleiras das lojas meio que "pulandinho", acompanhando as batidinhas repetidas e a voz mansinha da cantora. E lá se vão nossos ienes! (Aposto que os consumistas mais descontrolados já levam um CD com a música da dupla também! hehehe)
Vou postar o vídeo aqui, plagiando o Darcy :P, para compatilhar com os amigos do Brasil o que é mais ouvido no japão hoje! (E pra quebrar o gelo do post de ontem tbm :)
Darcy Suzuki, gentilmente postou a tradução da música que não nos deixa escapar, em seu blog. Eu até pensei em colar a tradução dele (também!) aqui, mas a preguiça foi maior (maior que a cara de pau!). Então, quem tiver curiosidade para saber a tradução pode clicar aqui e será cibertransportado para o desvendamento de nossa atual hipnose sonora.
terça-feira, 26 de fevereiro de 2008
Tempo, saudades, oportunidades e afins
Hoje pela manhã o Alex me perguntou se estou
arrependida de virmos para o Nihon. Resgatei em segundos, os motivos que nos impeliram pra cá, antes de dar qualquer resposta. E, então, respondi que nós estávamos mesmo entrando num caminho cíclico no Brasil...
Tivemos (ambos) que ceder a este processo desgastante, que tem sido o Japão para nós.
Hoje é dia de saudades e melancolia, mas só hoje. Amanhã será um novo dia! :)
AS TRES VIAS DE ACESSO
Por Janer Cristaldo http://www.baguete.com.br/colunasDetalhes.php?id=2119
Após ler minha crônica sobre os cavacos do ofício do jornalismo, uma amiga me pergunta porque não estou lecionando numa universidade. Coincidentemente, a resposta está no artigo de Cláudio de Moura Castro, na Veja da semana passada:
“Na UFRJ, um aluno brilhante de física foi mandado para o MIT antes de completar sua graduação. Lá chegando, foi guindado diretamente ao doutorado. Com seu reluzente Ph.D., ele voltou ao Brasil. Mas sua candidatura a professor foi recusada pela UFRJ, pois ele não tinha diploma de graduação. Luiz Laboriou foi um eminente botânico brasileiro, com Ph.D. pelo Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech) e membro da Academia Brasileira de Ciências. Mas não pôde ensinar na USP, pois não tinha graduação”.
Estas peripécias, eu as conheço de perto. Começo pelo início. Nunca me ocorreu lecionar na universidade. Eu voltara da Suécia, cronicava em Porto Alegre e fui tomado pela resfeber, doença nórdica que contraí na Escandinávia. Traduzindo: febre de viagens. Li nos jornais que estavam abertas inscrições para bolsas na França e me ocorreu passar alguns anos em Paris. A condição era desenvolver uma tese? Tudo bem. Paris vale bem uma tese. Tese em que área? Busquei algo que me agradasse. Na época, me fascinava a literatura de Ernesto Sábato. Vamos então a Paris estudar Sábato.
Mas eu não tinha o curso de Letras. O cônsul francês, ao me encontrar na rua, perguntou-me se eu não podia postular algo em outra área. Em Direito havia mais oferta de bolsas. Poder, podia. Eu cursara Direito. Mas do Direito só queria distância. Mantive minha postulação em Letras. Para minha surpresa, recebi a bolsa. A França me aceitava, em função de meu currículo, para um mestrado em Letras, curso que eu jamais havia feito. Nenhuma universidade brasileira teria essa abertura. Aliás, os componentes brasileiros da comissão franco-brasileira que examinava as candidaturas, tentaram barrar a minha. Fui salvo pelos franceses.
Fui, vi e fiz. Em função de meu currículo, aceito para mestrado, fui guindado diretamente ao doutorado. Tive o mesmo reconhecimento que o aluno do MIT. Acabei defendendo tese em Letras Francesas e Comparadas. Menção: Très bien. Não me movera nenhuma pretensão acadêmica, apenas o desejo de curtir Paris, suas ruelas, vinhos, queijos e mulheres. A tese não passou de diletantismo. De Paris, eu escrevia diariamente uma crônica para a Folha da Manhã, de Porto Alegre. Salário mais bolsa me propiciaram belos dias na França. Foi quando minha empresa faliu. Conversando com colegas, fiquei sabendo que um doutorado servia para lecionar. Voltei e enviei meu currículo para três universidades. Sei lá que loucura me havia acometido na época: um dos currículos enviei para o curso de Letras da Universidade de Brasília.
Fui a Brasília acompanhar meu currículo. Procurei o chefe do Departamento de Letras. Ele me cobriu de elogios, o que só ativou meu sistema de alarme. Que minha tese era brilhante, que meu currículo era excelente, que era um jovem doutor com um futuro pela frente. Etc. Mas... eu tinha apenas os cursos de Direito e Filosofia, não tinha o de Letras. Me sugeria enviar meu currículo ao Departamento de Filosofia, já que a tese tinha alguns componentes filosóficos.
Ingênuo, fui até o Departamento de Filosofia. O coordenador me recebeu muito bem, analisou minha tese, cobriu-a de elogios. Mas... eu não tinha o Doutorado em Filosofia. Apenas o curso. Considerando o grande número de artigos publicados em jornal, sugeria que eu fosse ao Departamento de Comunicações. Besta atroz, fui até lá. O coordenador considerou que meu currículo como jornalista era excelente. Mas... eu não tinha o Curso de Jornalismo.
Na Universidade Federal de Santa Catarina abriu um concurso para professor de Francês. Já que eu era Doutor em Letras Francesas, me pareceu que a ocasião era aquela. Duas vagas, dois candidatos. Fui solenemente reprovado. Uma das alegações foi que eu falava francês como um parisiense, e a universidade não precisava disso. A outra, e decisiva, era a de que eu tinha doutorado em Letras Francesas, mas não tinha curso de Letras.
Já estava desistindo de procurar emprego na área, quando fui convidado para lecionar Literatura Brasileira, na mesma UFSC que me recusara como professor de francês. Convidado como professor visitante, o que dispensa concurso. Mas o contrato é por prazo determinado, dois anos. O curso precisava de doutores para orientar teses e eu estava ali por perto, doutor fresquinho, recém-titulado e livre de laços com outra universidade. Fui contratado.
Acabei lecionando quatro anos, na graduação e pós-graduação. Findo meu contrato, foi aberto um concurso para professor de Literatura Brasileira. Me inscrevi imediatamente. Uma vaga, um candidato. Me pareceram favas contadas. Ledo engano. Eu não tinha o curso de Letras. Fui de novo solenemente reprovado.
Na mesma época, abriu um concurso na mesma universidade para professor de espanhol. Ora, eu já havia traduzido doze obras dos melhores autores da América Latina e Espanha (Borges, Sábato, Bioy Casares, Robert Arlt, José Donoso, Camilo José Cela). Vou tentar, pensei. Tentei. Na banca, não havia um só professor que tivesse doutorado. Pelo que me consta, jamais haviam traduzido nem mesmo bula de remédio. Mais ainda: não tinham uma linha sequer publicada. Novamente reprovado. Minhas traduções poderiam ser brilhantes. Mas eu jamais havia feito um curso de espanhol.
Melhor voltar ao jornalismo. Foi o que fiz. Anos mais tarde, já em São Paulo, por duas vezes fui convidado para participar de uma banca na Universidade Federal de São Carlos, pelo professor Deonísio da Silva, então chefe de Departamento do Curso de Letras. Uma das bancas era para escolher uma professora de Literatura Espanhola, outra uma professora de Literatura Brasileira. Deonísio sugeriu-me participar, como candidato, de um futuro concurso. Impossível, eu não tinha o curso de Letras. Quanto a julgar a candidatura de um professor de Letras, isto me era plenamente permissível.
Por estas e por outras – e as outras são também importantes, mas agora não interessam – não estou lecionando. Diz a lenda que na universidade da Basiléia havia um dístico no pórtico, indicando as três vias de acesso à universidade: per bucam, per anum, per vaginam. Lenda ou não, o dístico é emblemático. A universidade brasileira, particularmente, é visceralmente endogâmica. Professores se acasalam com professoras e geram professorinhos e para estes sempre se encontra um jeito de integrá-los a universidade. A maior parte dos concursos são farsas com cartas marcadas. Pelo menos na área humanística. As exceções ocorrem na área tecnológica, onde muitas vezes a guilda não tem um membro com capacitação mínima para proteger. Contou-me uma professora da Universidade de Brasília: “eu tive muita sorte, os dez pontos da prova oral coincidiam com os dez capítulos de minha tese”. O marido dela era um dos componentes da banca. A ingênua atroz – ou talvez cínica – falava de coincidência.
Na universidade brasileira, nem um Cervantes seria aceito como professor de Letras, afinal só teria em seu currículo o ofício de soldado e coletor de impostos. Um Platão seria barrado no magistério de Filosofia e um Albert Camus jamais teria acesso a um curso de Jornalismo. No fundo, a universidade ainda vive no tempo das guildas medievais, que cercavam as profissões como quem cerca um couto de caça privado. Na Espanha e na França, desde há muito se discute publicamente a endogamia universitária. Aqui, nem um pio sobre o assunto. E ainda há quem se queixe quando os melhores cérebros nacionais buscam reconhecimento no Exterior.
quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008
Valentine's Day. Chocolate's Day.
Há alguns anos atrás, Antônio, era o santo da mulherada, praticamente. (Foi o que ouvi dizer.) Mas, parece-me, e, claro, posso estar muito errada, tô vendo uma clientela diferente choramingando ao Santo... Tenho visto amigos (homens) recorrendo ao casamenteiro celestial porque as estratégias terrestres não estão funcionando mais...E eu que achava que casamento estava fora de moda, tenho me surpreendido.
(Falando nisso, amigas interessadas! Entrem em contato pelo meu e-mail. Tenho uma lista de mocinhos! Serviço sigiloso, sem compromisso e sem taxa de entrega. Experiência no ramo. Servimos bem para servir sempre.)
Deste lado do mundo, o Santo Antônio é desconhecido, mas também tem dia dos namorados, ou o Valentine's Day (mais uma importação cultural). Dois dias, aliás! O primeiro é 14 de fevereiro, quando as mulheres dão chocolates para os namorados, pretendentes, amigos coloridos (e desbotados), chefes, professores e outros...Claro que os chocolates distribuídos são diferenciados. Para os amigos, chefes e outros as mulheres oferecem o "Giri-Choco" cujo objetivo é expressar agradecimentos. Para "o favorito", a oferta tem outro nome: "Honmei-Choco". Para não haver confusões tem cartões que acompanham, selos, adesivos, enfim...
No dia 14 de março é a vez dos homens retribuírem os presentes (um mês depois). E este dia tem outro nome: White Day. Dia em que as mulhres ganham chocolates brancos ou marshmallows, geralmente. Claro que não é obrigatório que os homens retribuam , mas é uma forma de ser bem educado. ( E é claro que se o cidadão "civilizado" não retribuir é porque a bela levou um fora. Neste caso: tem que chorar e pensar que tudo passa! Se estiver muito difícil de esquecer, muito mesmo, a dica é: pensar que ele vai ficar gordo, muito gordo e barrigudo, muito barrigudo! Isso pode ajudar...)
TODAS AS CARTAS DE AMOR SÃO RIDÍCULAS- Álvaro de Campos
Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.
Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.
As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.
Mas, afinal, Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.
Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.
A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são Ridículas.
(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)
quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008
Se eu pudesse...
Do Japão
Quero uma máquina de filmar sonhos
Pra registrar nas noites de verão
Meu corpo astral leve, feliz, risonho
Voando alto como um gavião
Que filme dentro de minha cabeça
Todo pensamento raro que eu mereça
Toda ilusão a cores que apareça
Toda beleza de sonhar em vão
Do Japão
Quero também um trem-bala-de-coco
Pra atravessar túneis do dissabor
Quero um microcomputador barroco
Que seja louco e desprograme a dor
Visitar um templo zen-desbundista
Conversar com um samurai futurista
Que me dê pistas sobre o sol-nascente
Que me oriente sobre o novo amor
Do Japão
Quero uma gueixa que em poucos minutos
Da minha queixa faça uma paixão
Descubra novos sentimentos brutos
E, enfeitiçada, tome um avião
E a gente vá viver num outro mundo
Pra lá do Terceiro ou Quarto ou Quinto Mundo
Onde a rainha seja uma açucena
E a divindade, a pena do pavão
segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008
Que diabo é esse?
Bem, Onis são espíritos da mitologia japonesa, que representam nossas paixões, ou instintos, de forma bem caricaturizadas.
Onis têm sua origem no Xintoísmo e, ao decorrer do tempo, entidades budistas foram acrescentadas ao grupo. E, como já deu pra perceber, há vários deles.
sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008
Setsubun
Este é mais um evento nipo cultural! Seguindo a tradição, os japoneses espantam os maus espíritos de casa de uma forma nada high tech...Ao contrário, o método "Ghost Busters" utilizado por aqui vem de eras, e chama-se mamemaki, ou, em nossas palavras: lançamento de grãos.
"Lançamento de grãos?" Exatamente! Lançamento, arremesso de grãos de soja torrados. Ficou com vontade de comer? Não tem problema! As pessoas arremessam os grãos, mas comem também! Calma, calma, calma! Explico. Vamos por partes:
1) Alguém na casa, geralmente o pai da família, usa uma máscara de Oni.* e então a festa da garotada começa. Esbravejando: “Fuku wa uchi! Oni wa soto!” (Sorte pra dentro! Demônios pra fora!") os moradores da casa vão espantando os maus espíritos e semeando (simbolicamente) os grãos para atrair a sorte.
2) Depois desse ritual, a segunda parte da tradição é: cada um come o número de grãos de soja correspondente à sua idade para que se tenha saúde por todo o ano.
Esta cerimônia acontece também nos templos e escolas, onde, algumas vezes, tem até encenação de espíritos malvados lutando contra divindades.
Ah, estes grãos recebem o nome de fukumame, isto é, grãos da fortuna (no sentido de sorte). E o ritual de arremesso para atrair a sorte, chama-se mamemaki, mas isto eu já falei! :/
PS: O Vic também participou do mamemaki na escola hoje pela manhã, já que domingo a escola não funciona. Voltou dizendo que “é uma brincadeira muito divertida!” :)
* Por enquanto vou dizer que Oni é uma entidade do mal. Muito feio, com chifres na testa e dentes assustadores, mas outro dia falo mais sobre o famigerado assustador.
quarta-feira, 23 de janeiro de 2008
Sabores Exóticos
Confesso: ano retrasado quando me disseram que aqui no arquipélago existe sorvete de feijão achei bizarro. Mas, quase dois anos depois, Alex me pegou desprevenida... Para quem não sabe, ele é o rei dos exóticos ( casou-se comigo- uma excessão, óbvio!).
Voltando ao rei dos exóticos, ele apareceu com um sorvete cor de creme, cheio de casquinhas marrons e oferecendo:
-"Experimenta..."
E assim descobri que um sorvete esdrúxulo pode ser uma saborosa descoberta! Ou, ainda, o que a linguagem não nomeia, a língua saboreia. (Não necessariamente, lóóógico!) Enfim, bobagens à parte, é fato que, se o Alex tivesse dito que aquilo era um sorvete de feijão, eu teria recusado a sobremesa categoricamente. Mas, como ele foi sagaz...TCHARAM!! Gostei. :) Pra falar a verdade, não é o melhor sorvete do mundo. Mas é bom, sim. (Só não criem grandes expectativas. Afinal, feijão não é chocolate, né?)
Outro sabor bem diferente por aqui , é o sorvete de chá verde. E deste eu não gostei mesmo! Mas, verdade seja dita: eu nem gosto muito de chá... Verde, então?! Urgh! Só sob tortura! Muito amargo! E o problema, pra mim, é que a guloseima gelada, tem um gostinho amargo que não nos deixa esquecer que é de chá verde... Se fosse só pelo aroma, tudo bem...Mas amarguinho num sorvete é mesmo de amargar, hein! :( (Depois desta estou atenta pra ver se não me deparo com sorvete de peixe também. HUAHAUHAUHAUHAH)
Eu gostaria de explicar melhor como são esses sabores, mas fico em débito. (Acabo de experimentar o quanto é difícil descrever um sabor...) Mas não fiquem tristes aí por isto! Soube que vocês podem experimentar sorvete de feijão e de chá verde na Liberdade, em São Paulo, segundo informações de colegas fãs do bairro e da cultura nipo.
Ainda quanto a apreciação do "sabor verde", tem tantas variedades de doces, biscoitos, bolos e chocolates sabor matchá, além do já dito sorvete, que encontramos lojas especializadas em guloseimas de chá verde. Incrível!
Isto tudo é exótico pra gente como eu, mesmo sabendo que docinhos de feijão e de arroz são comuns no nipo- world...Uma coisa é o sujeito saber que existe. Outra coisa é o sujeito ter experimentado uma vez ou duas numa festa das nações em, seu país. E outra coisa, ainda, é o sujeito conviver com isto tudo diarimente e ver lojas especializadas nesses sabores, ou ver gente se espantando com o seu espanto sobre isso tudo, entendem? (Acho esta experiência interessante: a de se espantar com o espanto dos outros...)Mas o exótico depende do referencial, não é mesmo?
Os japoneses acham exótica, por exemplo, uma bela feijoada (aliás devem achá-la muito feia!) e não necessariamente apreciem este prato popular brasileiro, Farofa? Coisa de outro mundo! Sopinha de fubá da minha vovó? Que fubá? Aqui só encontramos fubá em lojas de produtos brasileiros...Enfim, tudo isso só pra enfatizar que exótico é O OUTRO...
Agora, cá pra nós, o sorvete de algodão doce que eu experimentei aqui é divino! Gente, aquilo dissolve na boca!!! Hmm.... Tem sabor de algodão doce, com a vantagem de não arder a garganta ao final, de tão doce que é - o que sempre acontece quando comemos o algodão doce. Em outras palavras, o sorvete não é enjoativo, nem super adocicado. Não! Este sorvete é suave e bom!Muuuuuuuuuito bom! Imperdível pra quem gosta de doce! E dele, se não tem aí no Burajiro, eu vou sentir saudades, ah vou... Vou sim!
quinta-feira, 17 de janeiro de 2008
Frio Frio Frio
quarta-feira, 16 de janeiro de 2008
Gaijin*.
Encontrei o vídeo abaixo e gostei por isto: ele mostra como vemos os kanjis ( ideogramas), como ouvimos os sons da língua "estranha" e como nos sentimos estranhos por aqui. Principalmente nos primeiros meses, a sensação e a rotina é bem esta (angustiante) que o vídeo permite a gente (re) experimentar...
Enjoy it!
*Gaijin: estrangeiro
segunda-feira, 14 de janeiro de 2008
Dia De Virar Gente Grande
Segundo a tradição, a moçada com 20 anos de idade completos, ou prestes a completá-los, celebra este dia com muita pompa. Aliás, tanta pompa que até parece casamento! O rito de passsagem é feito perante as autoridades locais. A coisa é "Chique nurtimo", como dizem aí no Burajiro...
Antes de chegar no Japão eu imaginava que encontraria gente andando de kimono com mais frequência. Isto não é assim. Hoje o kimono é utilizado em comemorações mais especiais, como neste dia da maioridade, casamentos e outras festas.
Para a celebração do Seijin no Hi, os jovens adultos vestem trajes formais. Rapazes usam terno e gravata e moças usam o furisode, um kimono especial e caríssimo! É comum as jovens usarem o furisode que herdaram de suas mães ou avós. Este Kimono é tão complicado quanto especial. A mulheres contratam profissionais para vestí-las de forma adequada, tamanha dificuldade de colocar aquele tanto de pano! Além disto maquiagem e penteados especias para o grande dia fazem parte da labuta feminina para o evento inesquecível.
Durante o dia, esses jovens, participam de uma cerimônia junto às autoridades da cidade, pais e familiares, quando são homenageados e lembrados (ou alertados?) sobre seus deveres e direitos. Muitos agendam uma sessão de fotos em estúdio (isto é muito comum aqui!) e algumas famílias promovem festas particulares. Outros simplesmente juntam-se aos amigos para bebemorar e fumar bas-tan-te!!! :/
Enfim, a idade de 20 anos para um japonês é notorimente especial. E não precisa ser linguísta, nem dominar o idioma para achar curioso (interessante) o fato de que a palavra usada para expressar 20 anos de idade é hatachi, enquanto que para as outras idades, diz-se o número correspondente a idade acrescentado de -sai. Por exemplo: Ichi-sai, Ni-sai, San -sai e assim por diante.
É isto. Aqui hoje foi feriado nacional. O Japão comemorou a maioridade de seus mais jovens adultos. A atual turma dos 20 foi finalmemnte (!) reconhecida pela sociedade como "gente grande". Turminha que acabou de adquirir o seu direito de voto, de casamento sem consentimento dos pais, de consumir bebida alcoólica em público e fumar (mais) à vontade. Parabéns aos jonvens que passaram para a vida adúltera. :-o Ops!
Obs: Foi feriado Nacional, mas o calendário da fábrica onde o Alex trabalha não concorda. E ele nem ficou triste. Foi trabalhar sem crise; não bebe, não fuma e já completou 20 aninhos faz tempo mesmo...
ps1: Peguei a foto da internet. Não sei quem é o dono, mas gostei muito. Coube perfeitamente no contexto.
ps2: O ps1 responde, de antemão, aos amigos esperaçosos de que eu apresente uma bela japonesinha a eles. Não, ela não é minha amiga, sinto muito rapazes.
ps3: Hj é dia 14 de janeiro (segunda segunda-feira do mês de janeiro) e não 13, como consta aqui em cima, no blog...Alguém sabe se tem jeito de arrumar isto?